A vida se mostra a cada passo
Budismo

A vida se mostra a cada passo




Aluno – Pela forma como o senhor expôs 'O pico da montanha' me parece que os objetivos não têm tanta importância, eles são de certa forma um guia, mas a escalada é que conta mais?

Monge Genshô – A vida se mostra a cada passo. Então, à medida que nós vamos indo num caminho, se nós ficarmos presos num objetivo isso vai ser ruim. É bom ter um objetivo, uma meta, porque isso nos cria uma certa direção, isso se faz constantemente nas empresas, cria planos, é frequente para mim. Mas  acontece algo inesperado e aí, o que vamos fazer? Vamos fazer de acordo com o inesperado, não adianta nos lamentarmos muito. Eu gosto muito da história de Thomas Edison quando o laboratório de Menlo Park pegou fogo, ele chamou toda a família para assistir, disse 'venham, venham, vocês nunca vão ver um incêndio como esse' cheio de produtos químicos de laboratório, um tremendo de um incêndio.

E ele naquela alegria, e era o laboratório dele, era a vida dele, tudo o que ele tinha construído até então. E a mulher perguntou 'mas você não está chateado que está pegando fogo em tudo o que você fez até agora?'. E ele falou assim 'mas pense no laboratório que eu vou fazer agora, um novo, vou fazer tudo melhor, os erros que tinham nesse não vai ter mais'. Ele já estava planejando na cabeça dele que iria fazer um muito mais espetacular do que o laboratório anterior. Então essa era a cabeça de Thomas Edison, por isso ele registrou milhares de patentes. Porque ele estava sempre pensando em uma nova solução.  Não estava preso num objetivo anterior ou no que ele tinha anteriormente, mas estava pronto a mudar de idéia. Pegou fogo? Ah, que oportunidade, o que nós vamos fazer agora? Isso diz muito sobre o caminho, o caminho é assim.

Quando você caminha na vida é assim, que bom que há mudança. Quando nós nos agarramos demais a lamentar aquilo que acabou nós não estamos vendo as grandes oportunidades que estão aparecendo. Agora Chudô San vai para o mosteiro de Sojiji Soin dentro de algum tempo, logo que os papeis estiverem prontos. E Jikihô San vai ser ordenada monja noviça e vai para Kasuisai, que é um grande mosteiro que tem um famoso tenzo,  um roshi que é mestre de cozinha, e ela vai ter uma enorme oportunidade. Vai ser difícil, complicado estar num país com uma língua diferente, uma cultura diferente, dentro de um mosteiro, não é fácil. Eu disse a ela que, se chorar, chore na cama, mas haver solidão, muito trabalho, pouco sono, exigência, uma cultura que não é tão carinhosa como a cultura brasileira, onde se exige muito das pessoas. Isso é uma tremenda oportunidade, então tem que ir com espírito livre, seja o que for, simplesmente a gente tem que pensar 'eu vou aguentar, eu vou aprender, eu vou continuar'.

Depois  que acostuma, começa a ficar cada vez mais fácil,  no fim vai ser um lugar de onde se terá saudades. Então é uma enorme aventura, uma grande oportunidade ganhar uma bolsa da Sotoshu  pra ficar internado num local, a instituição vai cuidar de você, tem cama, comida, lugar para lavar roupa, e grande treinamento. Quando voltarem serão monges de outro nível e ajudarão imensamente nossa comunidade. À medida que essas coisas vão acontecendo torna-se possível, por exemplo, que eu possa morrer e saber que a comunidade continua. E isso é maravilhoso. Então trilhar o caminho assim, quem suporia que isso poderia acontecer? Quando Jikihô San chegou a primeira vez na Sangha, sentou à mesa, eu perguntei a ela 'quem é você, o que você faz?' e ela respondeu 'eu sou quituteira', eu me lembro até hoje, ela disse 'eu sou quituteira, eu faço quitutes'. Agora ela vai ser uma chefe de cozinha com treinamento num dos lugares mais difíceis de ter acesso no mundo. Não é fantástico isso? Quem poderia supor? Se tivesse um objetivo outro não seria assim. Sem objetivo de repente as portas se abrem, basta se esforçar, treinar continuamente. É isso, então. O caminho se mostra a cada passo. E se você não tiver restrições na sua mente ele é absolutamente inesperado. (continua)



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