Aluno não é discípulo
Budismo

Aluno não é discípulo


                   Mestre raspa os últimos fios de cabelo em cerimônia de ordenação de monge

A relação professor/aluno é uma relação de certa maneira simples. É a relação que temos nesse momento. Admitimos que haja um professor dando uma aula e nós o ouvimos. Não significa uma escolha profunda, mas uma situação momentânea que acontece nas escolas, nas universidades e em “n” situações.

Podemos ouvir o professor com bastante reserva e não somos obrigados a aceitar nada. Uma relação mestre/discípulo, não é uma relação professor/aluno, ela é, no Zen, uma relação em que escolhemos alguém para ser nosso mestre na vida e essa escolha deve demorar, não deve ser apressada.

Normalmente os alunos visitam vários lugares, ouvem diferentes pessoas até encontrar um local onde se sentem conectados, se sentem bem, sentem que aquele lugar fala ao seu coração, que aquele professor específicamente está falando ao seu coração. Depois de um tempo bastante variável, pode ser que se estabeleça uma relação mestre/discípulo e nessa relação não existe uma atitude crítica e sim uma aceitação ampla daquilo que esta sendo ensinado, com um mínimo de resistência.

Três características definem o discípulo, silente, obediente e não resistente. Significa, eu ouço e fecho minha boca, sou silencioso, mesmo que eu não concorde, fecho minha boca na esperança de que mais tarde eu entenda aquele ensinamento, agora não entendo, mas não protesto, fico silente. Obediente, o mestre diz, “Faça isso!”, eu vou e faço, não importa se parece coerente ou não. As vezes os mestres pedem coisas que parecem sem sentido, por exemplo, “limpe essa sala”, e você olha e a sala está imaculadamente limpa, mas você vai lá limpar. Significa que não protesto nem penso se tem sentido ou não fazer aquela prática que o mestre está me pedindo.

 Em algumas escolas o mestre pode dizer ao seu discípulo, ”faça cem mil prostrações” isso significa que terei que fazer no mínimo cem prostrações por dia durante três anos para poder acumular as cem mil prostrações. O discípulo não contesta isso, ele simplesmente assume a tarefa. Existem histórias de mestres do passado mandando o discípulo construir uma torre e depois de pronta, desmontá-la, e depois construa a torre novamente. Numa célebre história isso acontece oito vezes.

Isso não é exclusivo do budismo, nos monastérios cristãos também existem esses tipos de práticas. Está chovendo e o Abade ordena aos monges que vão regar o jardim. É preciso ter plena consciência do que é obediência não resistente para pegar o regador e ir na chuva regar o jardim. Evidentemente todos podem se dar conta que tem que haver absoluta confiança na relação mestre/discípulo para se fazer esse tipo de prática, porque ela, dentro de si mesma, tem riscos.

Normalmente no Zen as instruções são de práticas gerais, ou seja, todos os dias levantamos num horário determinado, como acontece num sesshin, vinte minutos depois sentados para fazer zazen. São instruções de prática ritual, “faça assim!”, não há um espaço para questionamentos do tipo, “Por quê quando o professor passa atrás eu faço gasshô?”. Você tem que descobrir sozinho.

Uma vez eu estava no mosteiro e passou o mestre atrás e por acaso naquele instante eu pensava em outra coisa, como minha mente viajou, ele passou, eu ouvi o ruído dos chinelos, mas não fiz gasshô. Ele simplesmente tocou no meu ombro e continuou adiante. No mesmo instante, percebi, ele sabe que embora aqui sentado imóvel de frente para a parede, estou distraído. Ele tocou no meu ombro para me dizer, “Volte para cá!”.

Então, a forma do Zen nos dá muitas informações. Nós podemos ficar atrás dos alunos e saber, por exemplo, ele está entrando na sala, e entra com o pé direito, posso saber facilmente através desse pequeno ato, “Ele não está atento!” e isso se repetirá em todos os momentos, na maneira de comer, na maneira de sentar, na maneira de andar, cada pequeno gesto, como está o mudra, podemos saber muito apenas observando o aluno. Na relação mestre/discípulo, a obediência ocupa um lugar central, porque exige o abandono do pensamento centrado em si mesmo, seu ego.

(Os posts são trechos de palestras de Monge Genshô decupadas da gravação por Chudô San e revisadas por Rachel San)



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